Atenção: Esse post é melhor apreciado ao som de Amon Amarth ou Manowar.
Uma coisa que sempre me atraiu no
heavy metal é a capacidade de contar estórias. A influência da música clássica
auxilia muito nesse quesito. Bandas como Blind Guardian e Avantasia narram
verdadeiros épicos através de variações de linas melódicas e uma narração digna
de chamar de poesia. As temáticas das estórias vão longe, desde temas históricos,
passando pela literatura e, é claro, a mitologia.
A mitologia nórdica tem um espaço
considerável no estilo. A imagem cristã dos guerreiros vikings incansáveis,
terríveis em batalha, é um prato cheio para narrativas de grandes guerras e
improváveis conquistas. Assim como na mitologia grega, os deuses nórdicos
representam, em uma escala divina, a humanidade. Mas quando olhamos para a
mitologia nórdica mais a fundo, encontramos elementos que os aproximam muito
mais do “jeito” metal de ver o mundo.
A fonte para as análises deste
post é o livro “Magic, Fate, and History: The Changing Ethos of the Vikings” da
antropóloga Rosalie H. Wax. Ela chama a atenção para alguns fatores peculiares
da mitologia escandinava. Uma delas é que na mitologia viking nada é estático,
tudo está em movimento. Por exemplo, o Sol e a Lua voam pelo céu e atrás deles
lobos correm com a intenção de comê-los. Outro exemplo é a árvore-mundo “Yggdrasill” que é sujeita a intermináveis assaltos e renovações,
serpentes roem as suas raízes e cervos rasgam seus ramos. Enquanto isso, Três
deusas banham a árvore com um líquido potente de um poço sagrado, só assim
Yggdrasill consegue se manter viva. Mesmo os deuses sempre estão fazendo alguma
coisa, Odin está sempre buscando sabedoria arcana, Thor Está sempre indo para o
leste enfrentar os gigantes, nada nunca para.
Isso tem tudo a ver com heavy metal, ainda mais os estilos mais épicos. As músicas
precisam sempre “se mover”. Os riffs deixam sempre clara a passagem do tempo. A
visão de mundo de um headbanger é de um mundo que muda e precisa ser mudado.
Assim como na mitologia nórdica, a impressão é que tudo pode ruir a qualquer
momento. Não há espaço para contemplação pura e simples, é sempre preciso
avançar, crescer, melhorar. Diferentemente da cultura grega ou judaica, na
mitologia nórdica os homens são responsáveis por suas ações, não há inspiração
ou manipulação divina, se queremos alcançar algum objetivo, nada nos carregará
até ele. Um choque de realidade muito comum em letras de heavy metal.
Outra
coisa interessante que eu vi neste livro é a substancialidade do mundo nórdico,
como diria Wax: “Se algo não pode ser sentido pelas mãos, ou, melhor ainda, não
emite som (ring) ou quebra quando acertado, não é considerado digno de nota; Se
algo não pode ser claramente visto pelo olho em seu contorno preciso e
definitivo, não vale a pena descrevê-lo”. Na mitologia viking os mortos nunca
viram fantasmas, eles ainda mantêm o seu corpo em Valhalla ou em Hel. Graças a
isso, o mito de criação viking não vem de um vazio primordial, mas de vastos
rios cósmicos alimentados por várias chuvas, esses rios congelaram e, quando
começaram a derreter, de uma gota nasceu o primeiro gigante de gelo “Ymir”. Mas
ele foi assassinado por Odin e outros deuses e estes fizeram o mundo a partir
do corpo do gigante: Do sangue dele fizeram os mares e lagos, da sua carne
fizeram a terra, dos seus ossos fizeram as montanhas, do seu crânio fizeram o
céu e de seu cérebro fizeram as nuvens.
Essa visão substancial do mundo é muito peculiar. Normalmente ligamos religiões e
mitologia a espíritos e coisas que não fazem parte do nosso plano, mas os
homens do norte não precisavam supor outro patamar para os seus deuses, eles
eram como eles. Com a forte característica antirreligiosa de alguns estilos de
metal, nada como uma mitologia onde todos podem ser quebrados, esmagados, cortados,
torcidos e rasgados. Essa forma materialista
de ver o mundo e os deuses se aproxima muito mais das pessoas com pouca crença.
Cantar sobre a alma quando você não é religioso é complicado, mas falar sobre
Thor, que é simplesmente um guerreiro com status de deus, não tem nenhum
problema. Ninguém sabe como Jeová é, mesmo Jesus transcendia a sua própria
carne, mas não havia dúvidas de como descrever Odin, grande e terrível.
A mitologia
do povo que se arranjou nos confins mais frios da Europa tem tudo para combinar
com o estilo de rock mais agressivo e mais fantasioso, mas a própria história
de conquistas dos Vikings também é uma ótima inspiração. Seu território se espalhou
pela Europa no inicio segundo milênio, chegaram a ter
possessões na Inglaterra, Alemanha, França, Itália, Rússia e até nas margens do
mar negro. Fora da Europa, dominaram parte da Groelândia e chegaram até a o
Canadá e invadiam constantemente territórios ao norte da África. Essa
Disposição expansionista somada a imagem da antiga literatura escandinava dos “Bersekers”
– Guerreiros incontroláveis lutando com inspiração religiosa fanática – Cria
uma imagem do povo guerreiro perfeito. O complexo de Davi e Golias não é uma
temática unânime nas músicas de heavy metal, muitas vezes é o mais forte que
vence, e os vikings, pelo menos nas lendas, sempre eram os mais fortes.
Talvez
haja algo na cultura dos Vikings que os aproximem mais intimamente com o heavy
metal, não deve ser por acaso que os países nórdicos são uma das principais
fontes de boas bandas. Da Finlândia temos Children of Bodom, Finntroll,
Nightwish e Stratovarius; da Noruega temos Burzum, Darkthrone, Dimmu Borgir,
Mayhen, Tristania e toda uma cena de Black Metal e Gothic Metal; Na Suécia
temos o Amon Amarth, Arch Enemy, HammerFall e Marduk; Na Dinamarca temos o King
Diamond e o Mercyful Fate (desculpem-me pelas bandas que esqueci). Para se ter
uma ideia, estamos falando de uma população total de aproximadamente 20 milhões
de pessoas, a mesma que a região metropolitana de São Paulo. Não há como negar
que os Vikings têm tudo a ver com heavy metal.
Post muito bom. Temática muito interessante e sempre abordada pelas bandas de hevay metal. Você esqueceu de mencionar aí Rhapsody.
ResponderExcluir=*, Jowzinha
Como não tenho onde criticar eu vo falar que você errou o nome de duas bandas ai.... kkkk
ResponderExcluirMuito legal. Comente sobre Celta!
Muito bom!!!
ResponderExcluirsei que é muito antigo, mas vou comentar. O texto está ótimo, e concordo com o guilherme, manda uma de celta na proxima x].
ResponderExcluirQue guitarra machado é essa!!!! eu quero uma dessa!
ótimo, adoro cultura por causa do metal, se dependesse das manifestações culturais do brasil eu não me fascinaria tanto kkk, ainda bem q pude conhecer nas letras das minhas bandas favoritas várias estórias e contos medievais épicos cativantes
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